Uma cidade educadora é aquela que incentiva atores da comunidade e todos os níveis de governo a terem a educação como preocupação central. Por isso, há ambientes que promovem a interação e a aprendizagem, e uma valorização dos lugares públicos para um uso constante pela população. Rosario, a cidade mais importante da Província de Santa Fé, na Argentina, é reconhecida como uma cidade educadora.
Como parte dos prêmios da 3ª Ação de Reconhecimento do Conviva de 2017, dois representantes das secretarias de educação de Autazes (AM), de Lagoinha do Piauí (PI) e de Petrolina (PE), vencedores da ação, passaram cinco dias em abril nessa cidade educadora. Ao lado dos articuladores responsáveis por apoiar as ações em seus respectivos estados e da equipe do Conviva, conheceram parques e escolas, conversaram com integrantes do governo e voltaram para o Brasil com encantamento, boas ideias e muita vontade de compartilhar os aprendizados.
Anita Stefani, coordenadora do Conviva, realizou neste vídeo um bate-papo com os dirigentes da educação de cada município diretamente de Rosario. E disse: “A forma como o governo argentino está organizado para administrar a educação é diferente da do brasileiro, com menos autonomia dos municípios, deixando a educação formal a cargo somente das províncias – que são equivalentes aos nossos estados. Mesmo assim, existem inúmeras boas iniciativas locais que podem ser inspiração para as ações de nossas secretarias municipais de educação, especialmente no que tange à parte pedagógica. Acreditamos que Rosario contribuiu para a formação dos municípios ganhadores do Reconhecimento e pode gerar importantes reflexões às demais equipes de secretarias brasileiras”.
Vinicius Evangelista e Thaisa Cavalcanti, integrantes da equipe do Conviva presentes na viagem, contam algumas de suas percepções: "Notamos como os ambientes de Rosario pretendem preservar o direito da criança de brincar, entre si e com os adultos, e como os governantes são sensíveis para os desejos e o olhar dos pequenos. São diversos espaços, muitos deles rústicos e com pouco investimento financeiro, mas que têm um porquê e possibilitam diferentes sensações e aprendizados. A visita das escolas para esses locais obedece a um calendário feito para todo o ano, aproximando as crianças dos equipamentos públicos".
A seguir, leia os depoimentos, saiba o que as secretarias de educação de Autazes (AM), Lagoinha do Piauí (PI) e Petrolina (PE) conheceram e como planejam incorporar essa vivência do exterior nas ações em seus municípios.
Cintia Maria da Silva Tupinambá, Dirigente Municipal de Educação de Autazes (AM)
“A política pública de Rosario como um todo nos chamou muita atenção. Ficou evidente a intenção educativa que os governantes têm por trás das práticas, com foco em desenvolvimento da imaginação, na construção de saberes e nos jogos. A criança é vista como cidadão completo, que tem o direito de opinar e participar das decisões.
A comunidade é o tempo todo convidada a participar, contribuindo para que as crianças aprendam. As iniciativas não são mirabolantes, e parecem possíveis de serem replicadas ou de gerar ideias semelhantes em nosso município.
Como próximos passos, vamos nos reunir com o restante da secretaria e os gestores das escolas urbanas e mostrar as experiências vistas na Argentina. Apresentaremos algumas das ideias que já tivemos e vamos ouvir e discutir sobre outras possibilidades. Pretendemos, por exemplo, incorporar a vivência sobre a cultura local na rotina escolar, assim como vimos na Escola Móvel, em que as crianças visitavam diversos espaços da cidade. A Ilha das Invenções também pode ser adaptada para nossa realidade: imagino criarmos um calendário de visitas para as escolas, fornecendo estrutura para ensinar determinados conteúdos de forma lúdica e em locais diferentes. Com as ideias organizadas, desenharemos um plano de ação e apresentaremos para o prefeito, com a intenção de implementar as ações como política pública.
Também pretendemos apresentar a experiência da viagem e o planejamento futuro para a nossa comunidade e para as outras secretarias, para reforçar a caminhada em conjunto que começamos a traçar.”
Franklis Lima Leal, Dirigente Municipal de Educação de Lagoinha do Piauí (PI)
“Durante a viagem para Rosario, notamos como a criança é participante das ações realizadas na cidade e vista como sujeito protagonista do processo de aprendizagem. Ficou claro que esse olhar da comunidade para os pequenos não ocorreu por acaso e nem de um dia para o outro, mas foi construído ano a ano. Nos ambientes públicos, vimos laboratórios vivos para construção das informações, respeito à pátria, à família e aos educadores. Existe uma sensação de pertencimento ao lugar. A impressão que se tem é que essas ideias não vão deixar de ser seguidas mesmo com uma troca de governo, porque fazem parte do pensamento dos cidadãos.
No retorno para Lagoinha, já nos reunimos com prefeito, secretarias, imprensa local e parceiros e contamos como foi a experiência na Argentina. Queremos transmitir a sensação de que não podemos trabalhar sozinhos, que temos uma responsabilidade enquanto grupo e que a educação é a base para que as ações de outras áreas funcionem bem. Penso que a Secretaria de Cultura pode colaborar conosco para planejar como incluir as danças, as músicas e o teatro na rotina dos estudantes. E outras secretarias, como Esportes e Meio Ambiente, também podem contribuir com novo olhar para praças, clubes e outros pontos da cidade, com a intenção de que possamos usá-los de forma especial, valorizando os ambientes externos como locais de educar, complementares à sala de aula. Gostaríamos de inserir na agenda do prefeito mais momentos de proximidade com as escolas, com escuta atenta ao que os alunos têm a dizer.
O nosso próximo passo será organizar uma apresentação oficial para professores, educadores, comunidade e alunos – afinal, além de merecer nossa atenção hoje, essas crianças e jovens serão os pais e professores de amanhã. Voltei para minha terra com muita vontade de melhorar a realidade da nossa comunidade! Noto que temos obrigação de fazer ações pelas crianças.”
Larissa Soeiro, Dirigente Municipal de Educação de Petrolina (PE):
“Nosso município tem cerca de 51 mil alunos e diversas dificuldades. Mas ficamos felizes em refletir, à luz da experiência de Rosario, sobre as iniciativas que já temos e como podemos potencializá-las. Uma delas é o projeto Prefeito do Amanhã, lançado em 2017, que inclui a visita do prefeito a algumas das escolas para escutar as reinvindicações dos estudantes. Vimos como é importante ouvir o que esses pequenos cidadãos têm a dizer sobre o local em que vivem. Não é raro os alunos apresentarem problemas em comum, o que pode nos dar pistas sobre as ações prioritárias da prefeitura.
Também fiquei entusiasmada em planejar uma troca de experiências entre as escolas de nosso município, dando luz sobre as iniciativas de sucesso para que outras possam incorporar as boas práticas. Uma instituição de nossa rede, por exemplo, criou o Programa Mais, que pretende chamar atenção no cotidiano para alguns assuntos, com ações batizadas de ‘Mais Conhecimento’ ou ‘Mais Respeito’, entre outros. Afinal, se está dando certo, por que não ampliar ações como essas em outras instituições?
Vendo a experiência de Rosario com a Ilha das Invenções e a Fazenda das Crianças, parques encantadores, me lembrei de dois locais de Petrolina que poderiam ser melhor utilizados: o Jardim das Crianças, parque municipal muito interessante, mas sem atividades pedagógicas e nem lúdicas, e o recém-aberto viveiro de plantas, que poderia ser usado para aulas ao ar livre.
Sabemos que Rosario tem um percurso longo de construção de uma cultura participativa das famílias na escola, mas pensamos que se fizermos pequenos incrementos no dia a dia colheremos bons frutos. Temos muitos casos de invasão em escolas e pouca valorização dos espaços públicos, e isso precisa ser mudado. Ao fazer parcerias com as secretarias de segurança, agricultura e saúde, por exemplo, é possível tentar incorporar atividades que não precisem de recursos financeiros, mas que sejam viáveis. Um caminho é começar com projetos pontuais e atuação em pequena escala, e depois ampliá-los para o restante do município.
Voltamos de Rosario faz pouco tempo e ainda precisamos nos organizar como equipe e com a prefeitura. Então outras ideias podem surgir! Nos próximos dias vamos apresentar as experiências que tivemos para a secretaria de educação e pensar juntos quais ações podem ser realizadas.”
A seguir, conheça alguns dos pontos visitados em Rosario pelos municípios brasileiros:
Em uma antiga estação de trem, foi adaptado um espaço de encontro para crianças e adultos investigarem, explorarem e aprenderem sobre ciência, artes e tecnologia por meio de projetos, mídia e formatos. Crianças e seus familiares brincam e criam juntos, em um ambiente rico em experimentações, como a fábrica de papel, de costura e de construção de materiais.
Cidade das Crianças
Local que marca o início do projeto político do município em 1996, de valorização dos espaços públicos, escuta das crianças e interação dos moradores. “As crianças compõem um conselho para expor suas ideias e necessidades. Cada pedido feito é acompanhado por justificativas, para que os pequenos reflitam e saibam argumentar”, conta Carleidy Borges, articuladora do Conviva no Piauí que participou da viagem.
Jardim das Crianças
O antigo zoológico da cidade é um passeio para todas as idades, com explosões de cor, espaços de beleza e jogos que desafiam os sentidos, com aventuras, mistérios, construções e poesia. “A criança coloca a mão na massa e percorre livre o espaço, que tem muito a ensinar e a divertir. Todos as propostas têm um objetivo pedagógico. Um dos espaços mais marcantes foi a floresta encantada, em que diversos sons de animais e vozes levam os visitantes a refletir sobre qual caminho seguir para chegar até a saída.”, conta Bruno Sizino, articulador do Conviva no Amazonas.
Escola Móvel
No programa Escola Móvel, crianças, adolescentes e adultos são convidados a conhecer diferentes locais na cidade. Os roteiros são planejados de acordo com a idade, sempre considerando a cidade como território de aprendizagem. Durante a estada da equipe do Conviva e dos municípios vencedores do Reconhecimento, o local visitado foi A Casa do Tango.
Fazenda das Crianças
A “Granja de la infancia” era um depósito de lixo que foi modificado e ocupa uma ampla área verde. No passeio, crianças e suas famílias podem correr, escalar e interagir com a natureza, com lago com animais típicos da região, jardim das borboletas, observação de animais, horta orgânica e fabricação de pães e doces.