A indicação de Abraham Weintraub como novo ministro da Educação do governo Jair Bolsonaro foi recebida com críticas e ressalvas por especialistas e representantes do setor ouvidos pelo G1. Weintraub foi anunciado nesta segunda-feira (8) após a demissão de Ricardo Vélez Rodríguez.
O novo ministro era secretário-executivo da Casa Civil, cargo considerado o "número 2" da pasta de Onyx Lorenzoni. Leia abaixo os comentários e análises sobre o nome e as metas que acreditam ser prioritárias para o novo chefe do MEC das seguintes entidades:
Perfil indicado
Em nota, Luiz Roberto Curi, presidente do CNE, afirma que tem expectativa positiva com o novo mandato.
"O CNE declara ser muito positiva a expectativa da chegada do novo mandato do ministro. O CNE, como um organismo de Estado trabalha em cooperação e sintonia com o MEC." - Luiz Roberto Curi, presidente do CNE
O Movimento Nacional em defesa do Ensino Médio questionou a experiência do indicado com a área.
“O nome é uma preocupação porque é uma pessoa mais ligada com o mercado financeiro e seguridade social do que propriamente educação. O fato de ser um professor não quer dizer que seja alguém da área. Então o que preocupa é não termos alguém no MEC vinculado a área da educação, alguém que seja conhecedor dos problemas da educação brasileira.” - Movimento Nacional em defesa do Ensino Médio.
Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, destaca a ligação do novo ministro com o grupo do escritor Olavo de Carvalho.
“Vélez foi indicado por Olavo de Carvalho, mas circulava entre os militares, pois consta que era professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Abraham Weintraub é ligado a Olavo de Carvalho e é também próximo do ultraliberalismo de Paulo Guedes, em especial da Reforma da Previdência. Mais uma vez o MEC está entregue a um homem dividido entre dois pilares do governo Bolsonaro. E, novamente, teremos um ministro que não entende de educação, especialmente de educação básica pública. A tendência é ele querer combinar guerra cultural olavista com privatização do ensino.” - Daniel Cara, coordenador-geral da CNDE
Carlos Vinicius, diretor-executivo da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned) aprovou a indicação.
"Trata-se de um nome que, com certeza, foi escolhido com todos os critérios necessários para promover e modernizar a educação brasileira, bem como superar as dificuldades de gestão enfrentadas pelo ex-Ministro (Ricardo Velez)." - Carlos Vinicius, da Aned
A presidente do Consed mostrou expectativa com o fato de o novo ministro, ao contrário do anterior, ter experiência na área de gestão.
“Esperamos que ele faça uma gestão democrática, discuta as necessidades e dificuldades que os estados e municípios têm para gerir a sua educação. As críticas ao ministro anterior eram em relação à falta de gestão e este novo ministro me parece ter experiência nesta área. Um gestor só é bom quando sabe escolher as pessoas” - Cecilia Motta (Consed)
Já o presidente da CNTE criticou a atuação ligação do indicado com o mercado financeiro.
“Coerente com o governo medíocre e privatista do Bolsonaro e um perigo para educação pública brasileira. A experiência de atuação no mercado financeiro desta pessoa poderá levar a negação do direito social e humano da Educação e aprofundar a educação como mercadoria. Precisamos continuar combatendo esta concepção privatista para a educação brasileira." - Heleno Araújo Filho (CNTE)
Para Olavo Nogueira Filho, diretor do Todos pela Educação, o perfil de Weintraub não é muito diferente do de Vélez no quesito "falta de experiência na gestão pública e na área da educação básica".
"Não é um nome conhecido do debate educacional, o que não necessariamente é, de partida, algo negativo. Com base nas informações que temos, o perfil é, em alguns aspectos, parecido com o do ex-ministro Ricardo Vélez: falta de experiência na gestão pública e na área da educação básica, associado a um discurso com alta carga ideológica. Dado o cenário de inoperância e diversionismo nesses 100 primeiros dias do MEC, parecia haver algum consenso, mesmo entre pessoas do próprio governo, de que o perfil haveria de ser diferente. A ver como o novo ministro compõe sua equipe e quais serão suas prioridades." - Nogueira Filho
Segundo João Batista Oliveira, do Instituto Alfa e Beto, Bolsonaro acertou na mudança.
"O presidente Bolsonaro conseguiu livrar-se das pressões de vários grupos e dar a volta por cima, indicando uma pessoa com experiência gerencial e afinidade com as convicções do governo. Isso dará ao ministro condições para fazer uma boa gestão. Se o fará são outros quinhentos." - João Batista Oliveira
O presidente Jair Bolsonaro e o novo ministro da Educação, Abraham Weintraub — Foto: Casa Civil, PR
Prioridades do MEC
De acordo com parte do especialistas ouvidos pelo G1, um dos assuntos prioritários para o MEC garantir o avanço das políticas educacionais é o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
Alessio Costa Lima, presidente da Undime, afirma que, além do Fundeb, a nova gestão do MEC deve retomar o diálogo com as redes estaduais e municipais e priorizar políticas concretas de melhoria da qualidade de ensino, inclusive dando continuidade a ações que já estão em andamento.
"Só as redes municipais detêm quase 50% das matrículas. Toda política tem que dialogar e escutar essas redes, ouvir suas reais demandas. Temos alguns programas que são importantes e que merecem continuidade, como a política da escola em tempo integral. (...) Outro grande gargalo da educação é a política de apoio à formação, sobretudo inicial, de professores. Em determinadas regiões do país o problema é mais crônico, não temos professores habilitados para determinadas áreas do currículo. (...) E outra pauta urgente é o financiamento para dar sustentação a todas essas políticas. A gente precisa ouvir qual é a opinião do MEC para o Fundeb." - Alessio Costa Lima, presidente da Undime
Maria Helena Guimarães de Castro, ex-presidente do Inep (1995 e 2002) e ex-secretária-executiva do MEC, cobra foco na gestão e no Fundeb.
"Para mim, o primeiro desafio é o ministro montar uma equipe. Alinhada, articulada e ter um plano imediato de trabalho para começar a funcionar. O MEC já perdeu muito tempo e agora não tem mais tempo para perder. (...) O ministro não é uma pessoa ligada à área da educação. É importante ele chamar as pessoas para conversar. (...) A terceira urgência urgentíssima é dar um encaminhamento ao Fundeb." - Maria Helena de Guimarães de Castro
Já Daniel Cara destaca que a posição do MEC sobre o Fundeb é central no debate.
"A prioridade é o Fundeb. O Fundeb financia, substancialmente, as 40 milhões de matrículas na educação básica pública. Porém, o Fundeb depende das vinculações constitucionais, sistema de financiamento da educação que contraria Paulo Guedes. Então, é preciso saber qual é a posição do novo ministro sobre o assunto." - Daniel Cara
O Consed aponta o Fundeb entre uma lista de quatro prioridades:
"Temos 4 prioridades: financiamento, principalmente dando continuidade ao Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), formação continuada de professores, manutenção das avaliações e a definição dos currículos do ensino médio fundamentado na BNCC" - Cecilia Motta
O Todos pela Educação também diz que é preciso redefinir os mecanismos de financiamento, além das regras de cooperação e formação de professores.
"Na educação básica, dar continuidade e aprimorar políticas já existentes que apontam no caminho correto é parte importante do que o novo ministro deveria buscar fazer. Até porque, estamos longe de um cenário de terra arrasada. Porém, se queremos resultados significativamente diferentes num setor tão estratégico para o país, há uma série de novas medidas que precisam ser efetivadas, em especial no que diz respeito às regras de cooperação entre União, estados e municípios, à revisão dos mecanismos de financiamento e à alterações profundas na formação de professores. Temas estes que sequer foram objeto de atenção do MEC nos 100 primeiros dias de gestão." - Olavo Nogueira Filho
Para Monica Silva, do Movimento Nacional em defesa do Ensino Médio, o Plano Nacional de Educação (PNE) deve ser a referência.
“A prioridade [da nova gestão] tem que ser cumprir com as metas do Plano Nacional da Educação, que busca garantir o empenho dos governos em assegurar o custo aluno e qualidade de ensino, formação de professores, ampliação do ensino médio, educação infantil, são as metas que estão no PNE que estão sendo ignoradas sistematicamente pelos governos” - Monica Silva
O PNE também deve ser o foco, na opinião da CNTE.
"O Brasil tem uma lei Federal para as políticas educacionais, que é a lei 13.005/2014 (Plano Nacional de Educação 2014-2024). Logo, qualquer que seja o ministro, ele ou ela tem a obrigação e o dever de cumprir as metas e estratégias do PNE, está deve ser a prioridade em um governo sério." - Heleno Araújo Filho
Na opinião do Instituto Alfa e Beto, a prioridade é alinhar o MEC à orientação de economia mais liberal do governo.
"Alinhar o MEC com a orientação geral do governo – uma orientação mais liberal do ponto de vista econômico, favorecendo a descentralização de decisões e recursos e tornando mais eficiente o gasto público e reduzindo o peso das corporações e grupos de interesse nas decisões. Isso vai exigir uma profunda mudança na forma de pensar e agir do MEC." - João Batista Oliveira
A Aned, que defende a educação domiciliar, aponta que o foco deve ser a "liberdade educacional".
"Garantir a Liberdade Educacional e o Pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, mediante a coexistência harmônica de modelos de ensino, além do escolar atual, a ex. da Educação Domiciliar, dentre outros. Quanto maior a Liberdade Educacional de um país (incluindo a educação domiciliar) maior o desenvolvimento educacional desse mesmo país, conforme estudos da OIDEL, órgão consultivo da ONU.” - Carlos Vinicius
Na opinião de Curi, presidente do CNE, a etapa da alfabetização e a formação de professores são consideradas "extremamente relevantes".
"Certamente, o ministro irá estabelecer as prioridades. A educação básica, sem dúvida, é uma área onde os direitos ao aprendizado devem ser ampliados e garantidos. A etapa da alfabetização e a formação de professores são extremamente relevantes. O combate à evasão na educação básica e na etapa do ensino médio, onde a evasão atinge mais de 50%, também. Tudo está associado ao aprendizado. Quanto ao ensino superior, entendemos ser relevante a análise e o fortalecimento do processo avaliativo e das políticas de estímulo à expansão relacionadas às áreas de maior relevância ao desenvolvimento da nação." - Luiz Roberto Liza Curi, do CNE
Título original: Críticas e expectativa marcam reações de entidades ao nome do 2º ministro da Educação do governo Bolsonaro